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Gestão: Escritórios lutam pela sobrevivência

Seminário realizado na semana passada discutiu as dificuldades e estratégias para contadores que investem em um negócio próprio

Em um mercado cada vez mais acirrado, os escritórios de serviços contábeis lutam para garantir sua sobrevivência. Apenas no Rio Grande do Sul, segundo dados do Conselho Regional de Contabilidade (CRC-RS), a classe é formada atualmente por cerca de 30 mil profissionais, reunidos em 1,6 mil sociedades ativas e 7,4 mil escritórios individuais, totalizando nove mil organizações contábeis.

 

Assim como as demais categorias, os contadores que investem em um empreendimento próprio e tornam-se gestores enfrentam questões como captação de clientes, investimentos em pessoal e tecnologia e definição por um foco principal de atividade. Devem garantir a manutenção do negócio e enfrentar a concorrência de companhias de grande porte, como a PricewaterhouseCoopers, com mais recursos para disputar as oportunidades de trabalho.

Para discutir o tema, o CRC-RS realizou, na semana passada, o seminário Os rumos das empresas de Contabilidade, abordando as aquisições e fusões no meio, com a participação dos contadores Irineu Thomé, Enory Luiz Spinelli e Nestor Biehl. Thomé, também empresário e autor do livro Empresas de Serviços Contábeis - Estrutura e Funcionamento, considera a aquisição de escritórios um caminho para se destacar. “Hoje somos mais empresários do que contadores, pelo menos uma parte da categoria. Como empreendedores, temos que nos preocupar com o crescimento da empresa”, ressaltou.

Conforme Thomé, o desempenho dos contadores é fundamentado na indicação entre pessoas. “É difícil prospectar clientes de outra forma que não seja através da recomendação entre eles. Você precisa prestar um serviço muito bom para que ele goste e indique a um amigo”, afirmou.

Uma forma de expandir os negócios rapidamente consiste na compra de outra organização. A prática não é tão comum, mas eventualmente são publicados anúncios com ofertas. Embora o receio de investir em uma negociação desse porte, Thomé aconselha aos colegas que verifiquem as razões que motivaram a venda, qual o ramo de atividade a que se dedica o escritório e perfil da carteira de clientes.

A realização de palestras e seminários promovidos pelas entidades para discutir os aspectos que envolvem a compra e a fusão a outros escritórios auxilia os contadores que buscam alternativas para ampliar seu ramo de atuação. “Dessas conversas surgem caminhos e troca de experiências. O fato é que, sem uma jogada mais arrojada, o escritório não cresce rapidamente. “É um pouco por ano, entre 2%, 3% ou 4%, conforme o período. Angariamos clientes assim como perdemos, não só pelo fato dele trocar de prestador de serviços como por aqueles que encerram seus negócios”, explicou Thomé.


Estruturas empregam em média cinco funcionários


A Pesquisa Anual de Serviços realizada em 2006 pelo IBGE traçou um perfil da estrutura dos escritórios de contabilidade. A maioria dos estabelecimentos do setor é formada por empresas compostas por cinco funcionários que dispõem de 1,5 computador para trabalhar. São organizações pequenas e enxutas, conectadas à internet, embora nem sempre com bons sistemas.

Nesse contexto, uma alternativa para garantir a sobrevivência dos pequenos negócios passa pela fusão a outros empreendimentos. A afirmação é do presidente do Sindicato das Empresas de Serviços Contábeis, Assessoramento, Perícias Informações e Pesquisas do Estado do Rio Grande do Sul (Sescon-RS) Luiz Carlos Bohn. O contador reconhece que em muitos casos a associação esbarra na dificuldade que os profissionais têm em deixar de querer ser o “dono do próprio nariz”.

“É preciso encarar a resistência e analisar casos em que vale a pena se unir a outro escritório.” Bohn lembra que, além de serem profissionais da contabilidade, os proprietários de escritórios são gestores de uma organização. Dessa forma, devem buscar as melhores alternativas para garantir a manutenção e lucratividade da empresa.

Outra questão de relevância para a atuação profissional é a capacidade de atendimento do escritório. O presidente do Sescon-RS considera inviável carteiras com 500 clientes. “A estrutura ideal para uma organização de dez a 20 pessoas é uma carteira entre 200 a 300 clientes”, aconselha. Mais que isso, diz Bohn, é difícil administrar.

No Estado, os contadores dispõem desde 1990 de uma tabela técnica de honorários referencial, onde são estabelecidos parâmetros e valores para os serviços. Os números são atualizados de forma que sejam aplicáveis. Mesmo assim, sempre há os que cobram valores muito baixos. “Esse profissional não terá como manter para sempre preços irrisórios. Ele não conseguirá avançar nos negócios; ou reajusta os valores cobrados e fica de acordo com a realidade ou fecha”, disse Bohn.

 

 

Transparência é fundamental

Para quem adquire um escritório ou uma carteira de clientes, a transparência junto aos funcionários e empresários atendidos pela organização é fundamental. Dependendo da maneira como a negociação for conduzida e comunicada a todas as partes envolvidas, uma nova relação pode ser construída e criada com grande afinidade.

Em alguns casos, entretanto, surgem problemas entre o novo proprietário e o quadro de empregados. “Há situações em que os funcionários acabam mandando mais do que quem adquiriu o escritório”, explicou Nestor Biehl. Na opinião do contador, muitas vezes é mais vantajoso aos jovens profissionais que ingressam no mercado começarem seu empreendimento do zero do que adquirir uma organização existente.

Outro ponto importante a ser considerado quando da aquisição de outra empresa, bem como da compra da carteira de clientes, é a realização de uma due diligence. A regra vale para as organizações de qualquer setor, inclusive as contábeis. A chamada diligência prévia consite no processo de investigação de uma oportunidade de negócio que o investidor deverá encarar.

O principal objetivo ao fazer uma negociação desse porte é ampliar a lucratividade. Aqueles que investem em uma fusão, aquisição de escritório ou de carteira de clientes devem ser profissionais capacitados a avaliar o negócio. O ideal é que o retorno do investimento ocorra entre 24 e 48 meses. “Quem compra a carteira de clientes deve se informar sobre como ele era atendido, buscando compreender o seu perfil”, afirmou o contador Irineu Thomé.

Os profissionais devem se conscientizar também sobre as mudanças que não só o setor passa mas também a sociedade em geral. Enory Spinelli lembrou que estamos em uma época de rápidas mudanças, alterações tecnológicas que impulsionam o cotidiano. O conhecimento do cliente atual difere daquele que os empresários possuíam nos anos de 1970 ou 1980, por exemplo.

“O cliente diz quero hoje, quero agora. Precisamos mudar nossa rotina”, diz Spinelli. A categoria deve mudar a cultura de atuação nos escritórios, saindo da geração do fazer e embarcando na era do conhecimento.


Investir no diferencial é alternativa para garantir competitividade

 

Além da aquisição ou fusão, outra solução para aqueles que desejam expandir seu empreendimento passa pelo investimento em serviços diferenciados, ora dedicando-se a uma área específica, ora ampliando o máximo possível o leque de atendimento. O seminário Os rumos das empresas de Contabilidade apresentou o case do escritório DCP Contadores, do Rio de Janeiro. Fundado há 25 anos, a organização oferece diversos serviços, não ficando restrita apenas à escrituração contábil.

Conforme o proprietário Manuel Domingues e Pinho, além da contabilidade societária e fiscal, fazem a contabilidade gerencial, atendem à área de impostos - inclusive Imposto de Renda Pessoa Física, sendo que 80% é de estrangeiros - obrigações acessórias, departamento pessoal e outras rotinas.

O diferencial oferecido pela DCP, segundo ele, é a gestão financeira realizada para cerca de 70 empresas. O escritório é responsável pelas atividades relacionadas ao departamento financeiro, contas a receber e a pagar, faturamento etc. “Nosso cliente não possui em sua empresa o departamento financeiro, ele encaminha a nós as tarefas correspondentes.”

Outro serviço ofertado é o de RH, oferecendo o recrutamento de pessoal e seleção. Para isso, dispõe de quatro psicólogas. A DCP faz também a gestão documental dos contratantes, que consiste em armazenar e organizar  arquivos, arrumando, catalogando e migrando  dados para o sistema de informática.

Uma das companhias atendidas pela DCP é a Petrobras. O escritório é responsável pela revisão fiscal e de pessoal. “A empresa possuía um grande débito junto ao INSS referente à contratação de subempreiteiros que realizaram obras e não pagaram os impostos corretamente. Agora, acompanhamos os serviços prestados à Petrobras e a entrega de guias ao INSS e outros departamentos.” A DCP acompanhou o cumprimento das obrigações por parte dos serviços terceirizados por ocasião da construção da plataforma petrolífera P52.

 

 

Charneski passa por reestruturação
 

O escritório Charneski Tributos e Consultoria, fundado há 20 anos por Bolívar Charneski em Porto Alegre, está reestruturando sua organização e mudando o enfoque de atendimento. A empresa atuava na área de consultoria, tributos e auditoria empresarial. Após avaliação estratégica, Charneski optou por focar os trabalhos em consultoria e na área tributária. “A auditoria está concentrada nas quatro grandes empresas - Pricewaterhouse Coopers, Deloitte, Ernst & Young e KPMG. As exigências não diferem para quem é um escritório de grande porte ou um pequeno.”

Outro fator citado por Charneski para a reestruturação é a evolução do processo de gestão, que demanda profissionais mais especializados em áreas como TI ou expertise no mercado financeiro. Além disso, o escritório convivia com um conflito de interesses: um cliente de auditoria não poderia ter seu planejamento tributário feito pela Charneski, segmento de forte atuação também da empresa.

Com anos de dedicação ao desenvolvimento do seu quadro de pessoal, Charneski teve o trabalho reconhecido pela Price, que contratou todos seus funcionários que desempenhavam as atividades de auditoria. O empresário acredita que a auditoria deve passar por revisão processual, inclusive por parte daquelas empresas que contratam os serviços, que desconhecem as questões de governança corporativa e os processos envolvidos. “Com toda essa crise que atravessamos, não temos claro o que esperar do auditor. Há muita desinformação dos dois lados, de quem contrata e de quem presta o atendimento.”