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Presença no consumidor.gov pode ser bom marketing para as empresas
Plataforma do governo Federal ajuda empresas e consumidores a resolver litígios de maneira extrajudicial. No segundo trimestre do ano, as empresas cadastradas no portal apresentaram índice de solução de problemas de 82,9%Cibele Gandolpho
Incentivar a resolução consensual de conflitos entre clientes e empresas é o principal objetivo do portal consumidor.gov.br. Trata-se de um serviço público on-line e gratuito que permite a interlocução direta entre os dois lados.
A plataforma foi lançada oficialmente em 27 de junho de 2014 pelo governo Federal e é monitorada pela Senacon (Secretaria Nacional do Consumidor), do Ministério da Justiça e Segurança Pública, além de Procons, defensorias, Ministérios Públicos e também por toda a sociedade, já que os dados são abertos e públicos. São protegidos apenas os nomes e contatos dos consumidores.
Para ter acesso ao site é preciso fazer um cadastro na plataforma digital de relacionamento do cidadão com o governo Federal - o Gov.br.
Quando uma reclamação é registrada no site, a empresa citada, previamente cadastrada no consumidor.gov.br, se compromete a analisar e responder publicamente e tentar resolver o problema em até 10 dias.
A participação das empresas na plataforma é voluntária e somente permitida àquelas que aderem formalmente ao serviço. O consumidor tem, então, até 20 dias para comentar e avaliar a resposta da empresa, informando se sua solicitação foi resolvida ou não. Ele também deve indicar seu nível de satisfação com o atendimento, gerando uma pontuação para a empresa.
Segundo dados oficiais do consumidor.gov.br, a plataforma registrou até outubro de 2023 mais de 7,3 milhões de reclamações e conta hoje com uma base de 5,14 milhões de usuários cadastrados e 1.362 empresas credenciadas. Esses dados têm crescido ano a ano.
Deste total, 48,2% das reclamações provêm da região Sudeste, seguida pela região Sul, com 19,7%, Nordeste (17,4%), Centro-Oeste (10,7%) e Norte (4%).
No Boletim 2022 do consumidor.gov.br, divulgado em março de 2023 pela Senacon, cerca de 80% das reclamações registradas no ano passado foram solucionadas pelas empresas participantes, que respondem às demandas dos consumidores em um prazo médio de sete dias, apesar de terem o limite de dez dias.
Os bancos, as financeiras e as administradoras de cartão (26,4%), além das operadoras de telecomunicações (17,4%), foram os mais reclamados, seguidos por transporte aéreo (9,3%), comércio eletrônico (8,4%) e viagens, turismo e hospedagem (4,4%).
VANTAGENS PARA AS EMPRESAS
É nítido que se trata de uma ferramenta bem efetiva para os consumidores, mas como ela pode ser útil para as empresas?
Segundo o advogado Bruno Pedroso, o uso do consumidor.gov.br tem como principal benefício ajudar as empresas a resolver os problemas extrajudicialmente. Permite ainda que elas melhorem seus processos administrativos, financeiros e operacionais, já que recebem indicadores da plataforma que apontam onde estão falhando com os consumidores.
“É um canal alternativo que permite resolver um entrave diretamente entre as partes envolvidas de uma forma rápida, transparente e eficiente. Ele não tem como objetivo substituir o SAC das empresas, mas sim ampliar o acesso dos consumidores para casos que não puderam ser resolvidos pelos canais tradicionais de atendimento. A ideia é evitar justamente que essas reclamações se transformem em litígios administrativos ou judiciais”, avalia o advogado.
Tanto é que a plataforma está disponibilizada no site do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, fruto de Acordo de Cooperação Técnica entre o TJSP e o Ministério da Justiça.
Além disso, Pedroso ressalta que as empresas também podem vislumbrar um marketing positivo quando estão cadastradas na plataforma porque ganham um selo e são visualizadas em um ranking para demonstrar seu empenho na resolução dos conflitos de consumo.
“Obviamente que isso só acontece com empresas que conseguem atender às regras do consumidor.gov.br, de responder às demandas e tentar resolver as reclamações. Uma companhia aérea brasileira tem usado frequentemente dados da plataforma para mostrar na imprensa em relatórios que é a empresa do setor que menos recebe reclamações no país”, conta.
Isso é possível porque as reclamações registradas alimentam uma base de dados pública com informações das empresas que tiveram os melhores índices de solução e satisfação, as que responderam às demandas em prazos menores, entre outros dados.
Outra vantagem é que, diferentemente do Procon, que em vários casos exige o deslocamento das partes para audiências de conciliação, o consumidor.gov.br é totalmente on-line. “Isso facilita muito e agiliza os casos. Não se trata de um procedimento administrativo e não deve ser confundido com o atendimento tradicional prestado pelos órgãos de defesa do consumidor, como os Procons, o Ministério Público ou Juizados Especiais Cíveis”, completa Pedroso.
E se uma empresa não resolver a reclamação de um consumidor no prazo estabelecido?
Segundo o governo, ela não corre risco de sofrer nenhuma sanção direta. No entanto, como a plataforma é monitorada por vários órgãos, é conveniente que ela dê atenção às inserções, já que se cadastrou.
Uma pesquisa realizada pela Senacon, divulgada em dezembro de 2022, mostrou que a maioria dos usuários que utilizam a plataforma recomenda o serviço. Os dados mostram que 84,8% dos consumidores tiveram uma experiência positiva e estão satisfeitos e 73% tiveram seus problemas resolvidos (total ou parcialmente).
A Azul linhas aéreas é uma das empresas que usam o portal do governo para identificar e solucionar problemas de seus clientes. A companhia também costuma usar os bons índices de solução de conflitos que obtém nas negociações como marketing positivo, estreitando a relação com o seu público.
Até agosto de 2023, a companhia finalizou 11.583 queixas registradas na plataforma, com um índice de solução de 91%, ficando na primeira posição no segmento de transporte aéreo.
“Dentro de nossa central de atendimento temos uma célula dedicada que cuida desse tipo de relacionamento, que adota caminhos e estratégias diferentes para cada tipo de experiência relatada”, diz Jason Ward, vice-presidente de pessoas e clientes da Azul.
COMO A EMPRESA SE CADASTRA
As empresas interessadas em aderir formalmente ao serviço devem preencher um formulário on-line e assinar um termo no qual aceitam alguns compromissos, entre eles, a intenção de conhecer, analisar e investir todos os esforços possíveis para solucionar os problemas relatados pelos consumidores.
O processo é composto por algumas etapas e começa com a análise do cadastro da empresa pela Senacon. Realizada a solicitação, a plataforma verifica se a empresa cumpre determinados requisitos, como CNPJ válido, se tem como foco principal o atendimento direto ao consumidor final, se atende aos regulamentos de área de atuação, se tem site acessível e um SAC ativo.
Constatada a adequação, a plataforma envia os guias sobre o funcionamento do portal, além do formulário e do termo de adesão por e-mail.
Ao assinar o termo de adesão, a empresa participante se compromete a acessar diariamente o site para acompanhar as reclamações recebidas, analisá-las e respondê-las em até 10 dias.
COMO O CONSUMIDOR SE CADASTRA
O cliente interessado em registrar uma solicitação deve acessar o portal e verificar na busca se a empresa contra a qual quer reclamar está cadastrada no sistema. A plataforma possui inúmeros filtros para facilitar uma busca apurada.
É possível fazer pesquisas por segmento de mercado, palavras-chave, assunto, fornecedor, dados geográficos, área, problema, período, classificação (resolvida / não resolvida/ não avaliada) e/ou nota de satisfação, entre outros filtros.
Por meio da aba Relato do Consumidor, é possível ler o conteúdo das reclamações de outras pessoas sobre a companhia em questão, ler respostas das empresas e os comentários finais dos consumidores. Quando se clica no campo Dados Abertos, é possível obter os dados atualizados dos indicadores da plataforma. Com isso, dá para fazer análises e cruzamento de dados.
Ao registrar a reclamação no site, inicia-se a contagem do prazo de dez dias para manifestação da empresa. Durante esse prazo, ela tem a oportunidade de interagir com o consumidor antes da postagem de sua resposta final.
Após a manifestação da reclamada, é garantida ao consumidor a chance de comentar a resposta recebida, classificar a demanda como resolvida ou não resolvida, e ainda indicar seu nível de satisfação com o atendimento recebido.
Se o problema não for resolvido, segundo a Senacon, o sistema não permite que seja registrada mais de uma reclamação com o mesmo assunto contra a mesma empresa. O objetivo é evitar que sejam realizadas reclamações duplicadas.
Usuária assídua da plataforma, a publicitária Cristina Alencar sempre recorre ao consumidor.gov.br para resolver entraves com empresas. Ela já entrou com solicitações contra plano de saúde, banco, fornecedora de energia, companhia de telefone celular e até uma loja de roupas.
“O portal do governo é muito rápido e as empresas se empenham em tentar resolver os problemas amigavelmente”, conta Cristina.
Ela revela também que teve um caso de uma dívida que tinha com uma empresa e tentou quatro vezes fazer um acordo de pagamento, mas não obteve sucesso. “Simplesmente não conseguia, não tinha retorno. Eles mandaram meu CPF para os órgãos de proteção ao crédito. Recorri ao consumidor.gov.br e, em seis dias, meu problema estava resolvido: a dívida quitada e eles deram início ao processo de retirada do meu nome de devedora”, lembra a publicitária.
INDICADORES
Os indicadores gerados pela plataforma do governo são constantemente usados pelos órgãos públicos para mostrar seus resultados positivos. É o caso da ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil), que no segundo trimestre de 2023 divulgou que as empresas aéreas receberam 20.280 reclamações no consumidor.gov.br, sendo que transportaram 26,3 milhões de passageiros pagos do período.
Isso representa o registro de 77,1 reclamações a cada 100 mil passageiros – uma queda de 32,8% em relação ao mesmo período do ano anterior.
Em relação ao desempenho no tratamento das reclamações, as empresas apresentaram no trimestre um índice de solução de 82,9% (8,1% acima do apurado no segundo trimestre de 2022).